Surto de doença respiratória na China gera alerta, mas risco de epidemia é baixo, dizem especialistas

Imagem ilustrativa. Foto: Paula Fróes/ GOVBA

Os casos de internação por pneumonia em crianças na China, nas últimas semanas, geraram preocupação pela similaridade do que foi observado há quatro anos, quando os primeiros casos que posteriormente seriam associados à Covid foram investigados.
 

Em razão disso, a OMS (Organização Mundial da Saúde) emitiu um alerta na noite da última quarta-feira (22) em que solicita às autoridades de saúde chinesas informações sobre as hospitalizações.
 

De acordo com o comunicado oficial, a entidade solicita os dados referentes ao surto de internações verificado desde 13 de novembro no país por pneumonia sem origem definida.

Relatos de hospitais pediátricos com grande número de atendimentos, muitos sobrecarregados devido às demandas de novos pacientes, assustam, mas é importante ainda manter a calma frente à situação, afirmam especialistas.
 

Para Alexandre Naime Barbosa, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, as informações disponíveis até o momento são muito pouco elucidativas sobre o que pode estar provocando essas internações. Na realidade, diz o infectologista, é provável que o aumento de doença respiratória seja relacionado a uma distribuição sazonal de vírus respiratórios no momento, o que não indicaria —até o momento— um risco de espalhamento.

“Agora, é o final do outono e início do inverno no hemisfério norte, o que pode explicar a circulação de vírus respiratórios que ocorre normalmente nesta época, como influenza, VSR [vírus sincicial respiratório, principal causador de bronquiolite] e outros agentes. Essa talvez seja, vamos dizer, a hipótese mais provável”, explica.
 

De acordo com ele, uma segunda hipótese poderia ser um vírus emergente ou reemergente (como o Sars-CoV-2 passou de animais para humanos, embora o hospedeiro intermediário ainda seja desconhecido), embora ela seja menos provável. “Por isso mesmo, a posição da OMS de solicitar os dados à China e acompanhar é corretíssima, inclusive em uma tentativa de consertar aquilo que vimos no início da pandemia”, afirma.

É importante também destacar que, até o momento, os casos parecem se concentrar em crianças e, até agora, não houve nenhum registro de óbito —o que reforça a hipótese que sejam, de fato, vírus ou outros agentes (como bactérias) respiratórios comuns em crianças, ou até mesmo a própria Covid.

Há, porém, muita especulação ainda sobre o que pode ser a causa, e sem uma definição clara do agente causador, não há muito o que se fazer a não ser adotar medidas já conhecidas —isolamento dos doentes, uso de máscaras, higiene das mãos. “Todos os países passaram por isso, em algum momento, de retorno de circulação de vírus, com a retirada das medidas de restrição da Covid. Por isso, é provável que seja isso, mas não há ainda muitos dados, então tudo, por enquanto, são conjecturas”, afirma o infectologista pediatra e vice-presidente do departamento de Infectologia da SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), Marcelo Otsuko.
 

A possibilidade do surto se espalhar para outras províncias e até mesmo países, no entanto, não é descartada.

“Enquanto a gente não tiver uma definição adequada, as medidas de proteção precisam ser mantidas, e isso inclui cuidados com qualquer viajante que for ao país chinês, mas isso é algo que a própria OMS está monitorando e vai poder definir com mais clareza. Faz parte de uma orientação global de vigilância epidemiológica”, diz.
 

É a vigilância, inclusive, que faz a detecção precoce de novos agentes respiratórios em circulação, com a realização de testagem em algumas das amostras colhidas nos chamados hospitais sentinela. Com a Covid, muitos dos vírus mudaram a estação e passaram a provocar surtos fora de época, conforme mostrou a Folha de S.Paulo.

É importante, assim, divulgar os dados de análise laboratorial das crianças hospitalizadas para poder definir com mais clareza qual seria o agente, se ele está dentro do que é esperado com a estação de outono e inverno, ou se é algo para gerar um alerta, explica a epidemiologista Denise Garrett, vice-presidente do Instituto Sabin para Vacinas.
 

“Muitos especialistas estão associando o aumento de doenças respiratórias recente às enfermidades típicas do inverno, considerando que este é o primeiro sem as restrições da Covid. No entanto, a ausência de um diagnóstico definitivo até o momento é motivo de preocupação”, diz ela.
 

Outra hipótese seria que as doenças respiratórias estariam relacionadas à infecção por uma bactéria comum em infecções respiratórias em crianças, a Mycoplasma pneumoniae, mas que esta seria resistente aos antibióticos.

“A gente sabe que existe um perfil de resistência aumentado em países asiáticos por esse agente, e o antibiótico usado com frequência é da classe dos macrolídeos, principalmente a azitromicina, que teve seu uso exagerado e inadequado durante a pandemia, com certeza influenciando o aumento da resistência”, explica Otsuka.
 

Para Garrett, é difícil ainda definir se o surto específico está relacionado a esse agente, mas as bactérias resistentes representam um desafio significativo de saúde pública global, já que limitam as opções de tratamento.

“Hipoteticamente, pode haver uma associação com o atraso das doenças sazonais e até mesmo consequências do uso indiscriminado de azitromicina, mas é desafiador estabelecer qualquer relação definitiva enquanto o surto ainda tem uma causa desconhecida”, diz a epidemiologista.  


 

Bahia Notícias

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